O convite para inscrição veio junto com uma imagem
magnética. Aquela negra de asas expressava pensamentos e sentimentos que vinham
fazendo parte do meu momento. Aquela imagem traduzia os meus desejos de conexão
(raízes e asas). Inscrevi! Quando soube que havia sido selecionada foi um misto
de alegria e responsabilidade. Para fazer parte daqueles 20+1 eu me dispus a
imergir verdadeiramente e, quem sabe, transcender.
Havia em mim uma expectativa de acessar informações
as quais eu desconhecia, de me familiarizar mais com tecnologias, mídias
digitais, arte eletrônica, wi-fi e tantos outros recursos deste tempo
contemporâneo. Mas mesmo com tantos pensamentos high tech eu tinha levado
comigo meu tambor, meu coração.
Já no primeiro dia, na visita ao Museu Afro Brasil, chorei ao ler um texto expondo
uma legislação para tratamento
“humanizado”dos escravos. Não que ali
houvesse muitas novidades, mas lembrar que meus , avós, bisavós passaram por
tudo aquilo e que está ainda tão próximo do tempo atual, dói.
Ainda no primeiro dia TC Silva nos explica que a
maior tecnologia é o tambor. E nos
convida a ouvir uma canção, ao toque do seu tambor, de olhos fechados. Lembrei
do meu coração.
Na noite deste mesmo dia, dentre outros vídeos,
Vincent Moon exibe um vídeo de congadeiros mineiros. Vejo naquela tela minhas
raízes e meu presente, o que sou.
Segundo dia, acordo com a cabeça a mil. Todos
aqueles imersos ao meu redor me instigam, queria conhecer a alma deles, seus
trabalhos. Mas em três dias (ou talvez mesmo em três vidas) isso não seria possível.
Desacelero!
Paulo Nazareh, meu conterrâneo, um artista tão
contemporâneo e tão ligado às suas raízes novamente me faz chorar. Almas
livres, que não se encaixam nem encaixotam, consideradas como loucas, mortas em
hospícios, seu corpos enterrados no solo para adubar e fortalecer raízes ou
vendidos para experiências em universidades contemporâneas.
Na vivencia com Daniel Lima, dentre outras, sai a
frase: “você já assinou sua alforria
hoje”?
Fechamos o dia com o Metabolismo Afro-simbólico de
Moisés Patrício. Corpos dançaram em roda, entregues a sua essência ancestral.
Desacelerei mais.
No terceiro dia cheguei coração e fui só tambor. Abrindo
os trabalhos com o toque e canto forte de Mãe Beth de Oxum, tocamos nosso tambores
e dançamos.
Ver Kbela, de Yasmin Thainá, foi nos ver mulheres
negras vencedoras, assumindo nossas raízes expressas nos nossos cabelos
crespos, com toda sua força poética.
Já na noite desse terceiro dia, Ricardo Brazileiro
quando fala de tecnologia fala de afeto.
Nesse momento já não tinha mais espaço para dúvidas dentro de mim.
Meu corpo negro e político desde o ventre de minha
mãe (bem lembrado por Diane Lima na primeira roda de conversa no primeiro dia)
sempre esteve conectado às suas raízes.
A descoberta de minha responsabilidade como Mulher Negra, o momento de assumir e ostentar meus cabelos
crespos, a luta diária contra o racismo, a valorização da cultura negra, tudo
isso faz parte da minha Raiz. E isso é o que alimenta minha arte!
Para afrotranscender saio dessa imersão com muitas
inquietações (inspirações), pessoas e histórias para (re)conhecer, um mapa
mental e uma resposta:
Fortalecer
a raiz, sempre. Raiz forte se encarrega do tronco, folhas e flores.
Sobre voar, é só
fechar os olhos e silenciar.
Elisa, 21/10/2015